No século IX, os combates pela unificação da coreia foram estimulando o aparecimento e consolidando a prática das artes marciais. Passando por inúmeras transformações, mas salvaguardadas por grupos restritos, viriam elas dar origem ao taekwondo, o esporte nacional coreano.
Há uns 1800 anos, a Coreia estava dividida em três reinos: Silla, Koguryô e Paek-je. Como Silla, era o reino menor, tinha que continuamente suportar invasões por parte de muitos saqueadores que moravam nos arredores. Foi assim, que durante o reinado de Chin Heung, 24º rei de Silla, criou-se um corpo de oficiais, todos descendentes de famílias culturalmente aristocráticas e membros da nobreza guerreira do lugar.
Este corpo de oficiais, denominado de Hwarang (irmão maior), tinham um treinamento rígido e sacrificado, a tal ponto que se chegava a temperar o caráter dos guerreiros para que fossem capazes de suportar as mais duras pressões.
Diz-se que um monge budista de identidade desconhecida, logou aos guerreiros de hwarangum código de honra a fim de orientar as suas condutas. Isso trouxe a eles como conseqüência uma sólida formação, não somente física, mas principalmente ética e moral, que os tornou comparáveis aos samurais do Japão. Eram peritos no uso de todos os tipos de armas, e chegaram a dominar com maestria também a luta sem armas em que se empregavam somente as mãos e os pés. Esta arte foi denominada de hwarang-do, podendo ser traduzida como “o caminho do irmão maio”. Graças a sua firme condição física e convicção moral e intelectual, estes homens pouco a pouco foram deixando de ser homens comuns, convertendo-se em representantes do povo ao qual defendiam.
As sucessivas lutas ganhas pelo pequeno império de Silla fizeram com que se unificassem os três reinos, e o Hwarang-do passou a ser símbolo nacional. Por esta época, as artes marciais floresceram na Coréia; porém devido ao cunho civilista que desempenhou mais tarde a dinastia Yi, durante a qual tudo o que estava vinculado ao militarismo carecia de apoio popular, e cedo tiveram seu ocaso. Até a ocupação japonesa, nos anos de 1909 a 1945, era proibida a prática de artes marciais. Mas, apesar disso, continuaram existindo, graças ao trabalho a que se dedicaram secretamente grupos reduzidos.
Nesses tempos, dois mestre – Song du ki e Han J. Dong – Trabalharam arduamente para manter viva a luta tae kyon, que quer dizer saltar, chutar. As origens desta arte remontam ao tempo do reinado de Silla, quando um general Yu Sin Kim, grande filósofo e seguidor da linha altamente espiritual da filosofia dos monges das montanhas (seita dô ro, que até hoje existe), em reunião com seus discípulos, criou-a secretamente, junto com uma técnica particular de uso de arco e flecha. Formou-se assim, um grupo de cavalarias e armas ligeiras, constituído por jovens guerreiros cultos e espiritualistas.
Esta arte foi sendo ensinada através dos tempos, e até a época da II guerra mundial, como contam os historiadores, o povo coreano seguia os ensinamentos dos monges. Mais tarde, em 1945, quando o país se tornou independente, o tenente Choi Hong Hi incumbiu-se de continuar difundindo para os soldados os ensinamentos do tae kyon, que se propagou rapidamente por toda a Coréia.
Em 1955, ocorreu uma assembléia, reunindo historiadores e mestres que, juntamente com grandes personalidades, fizeram nascer a arte marcial nacional, que recebeu o nome de Tae Kwon Do. Esta nova arte, tem muita semelhança com o estilo antigo do tae kyon; recebe contudo, uma conotação muito mais nacionalista, onde são suprimidas as influências que sobre ela exerceram as artes de outros países.
KOGURIO E PAEK-JE: REINOS CONQUISTADOS
Falando de nacionalismo, reportemo-nos a bandeira da Coréia do Sul, um magnífico exemplo de equilíbrio entre as forças opostas da natureza: o antiqüíssimo e milenar símbolo oriental Yin e Yang, a eterna dualidade do universo. Ela possui um círculo central de duas cores, vermelho e azul, e em cada um dos quatro cantos laterais aparece em posição transversa, grupos de barras negras: representam, o céu e a terra, o fogo e a água. O círculo central, representa a eterna dualidade entre o masculino e o feminino, o positivo e o negativo, o fogo e a água, numa impressionante coerência entre os elementos das forças universais.
Passamos agora a descrever cada um dos três reinos que deram origem a Coréia unificada e influíram predominantemente na caracterização da arte nacional, o Taekwondo.
O reino de Kogurio, originado na tribo mahan, foi fundado no norte da Coréia no ano de 37 a.C. e sua hegemonia durou até o ano 688, quando passou a fazer parte de Silla.
A sociedade deste reino era muito dinâmica para sua escassa maturidade, o que se refletiu no desenvolvimento de suas artes estéticas. Em seus templos, palácios, monumentos e tumbas, podemos apreciar ainda hoje esplêndidos murais afrescos e esculturas, representando cenas viris de combates marciais. Os famosos baixo-relevos das torres kumkom, e os afrescos dos muros dos palácios de kacyuching foram realizados graças ao apoio oficial do governo. O mais bem conservado destes afrescos ilustra uma posição de Tae kwon do que guarda semelhanças com uma postura moderna de Nalchigi. As famosas estátuas de Kunkang (guardiões do templo de sokul-am, no monte Tohan) ilustram em perfeito estilo as posições do moderno Tae kwon do. Os trajes de combate armado, que aparecem em outros documentos gráficos, incluem capacetes de combate, escudos harmoniosamente decorados com plumas e peles, o arco convexo para uso a cavalo e a famosa flecha. Os cavaleiros também usavam espadas de ponta curta, com guarda-mãos circulares e protetores para os dedos, nos quais penduravam enfeites de fios trançados, possivelmente de seda. Como esporte, as lutas livre, corpo-a-corpo, eram mais populares.
Kogurio foi absorvido por Silla com facilidade por haver menosprezado excessivamente as artes intelectuais.
A VITÓRIA DE SILLA E A UNIFICAÇÃO
O reino de Paekje, situado a sudoeste da península, foi fundado pela população da tribo chinan, entre os anos 15 e 20 a.C., e durou até ser conquistado por Silla no ano de 660, na guerra da unificação. Como nunca chegou a ser uma potência militar, sempre foi vencido nos confrontos que ocorriam.
Inteiramente voltado para artes intelectuais, mesmo quando Kogurio tornou-se uma potência agressiva, ameaçando sua situação política, Paekje continuou seu desenvolvimento cultural, convertendo-se em um dos centros artísticos mais importantes da época.
A forma hinayana do budismo ganhou influência a partir do ano 384, e as inclinações intelectuais de Paekje puderam então ser canalizadas para a religião. Foram construídos magníficos templos e monumentos.
Quando as forças de Silla, aliadas aos chineses da dinastia Tang, arrasaram este frágil reino. Pouco ou nada restou de sua cultura.
Concretizado como reino pelas tribos pyon-han do sudoeste da região, no ano 57 a.C., Silla estendeu sua influência até o anos de 935, quando, dono ja de toda a Coréia, transformou-se no reino de Koryo, de onde provém o nome atual do país.
Silla foi fundada pelo nobre príncipe Park Hio Kose, que estabeleceu sua capital em Kyongyu, embora no início não representasse mais que a unificação de clãs federados.
No século IV emergiu como potência militar, ainda sem pretenções de conquista, devido a distância entre seus territórios e aqueles dominados pelos chineses do norte. Entretanto, o verdadeiro perigo não era a China, mas sim seus vizinhos, Koguryo e Paekje, e o império do Japão. Essa foi a verdadeira razão de ter se formado um tremendo exército de Silla.
Sua coesão e organização em combate, eram determinadas pelo fato de que os chefes de guerra provinham da respeitada nobreza de cada um dos clãs que formavam o reino e mantinham relações até de tipo familiar e amistoso. Seus inimigos, ao contrário nunca lograram este tipo de unidade por causa de suas rivalidades pessoais e da profunda ambição de seus senhores de guerra.
A partir do ano 500, o exército aliado de Kogurio e China, começou a a se tornar tão poderoso que a situação de Silla chegou a ficar ameaçada devido às constantes invasões fronteiriças.
A perspectiva de dominado totalmente pela China nao agradou o rei Chin Hung, que no 37º ano de seu reinado, convocou todos os nobres patriotas do país para compor uma sociedade secreta e de caráter militarista que, a maneira de uma academia, formaria os eventuais chefes de guerra. Essa sociedade teve fundamentalmente importância na formação do Hwarangdo.
O seleto grupo de jovens que praticava artes guerreiras também estudava poesia, história, música, moral e caligrafia, com o intuito de temperar seus corpos espíritos com o máximo amor a pátria. Em meio as expedições de guerra, os membros do Hwarangdo viajavam constantemente aos aos lugares históricos e significativos para seu povo. Chegou ao máximo do poder e da afetividade em meados do século VIII.
Como conseqüência lógica desta estrita disciplina e organização, um dos chefes do Hwarangdo, o general Kim Yu Sin, conseguiu unificar os três reinos da Coréia, sob o comando de Silla, no ano de 668.
Entre os anos 634 e 653, Silla teve duas rainhas em seu trono, e foram ela que iniciaram as relações diplomáticas e culturais com o império chinês. A rainha Song Dok chegou a enviar estudantes militares a fim de aprender as táticas de guerra chinesas e, ao mesmo tempo, verificar as reais intenções do poderoso vizinho.
O espírito tsun tzu, filosofia de vida dos integrantes do Hwarangdo, é considerado a raiz do famoso buchido (código de honra dos samurais do Japão). Ambos os vocábulos podem ser traduzidos por “caminho a flor da honra do bem”. O rei de Silla, Chin Hung, foi quem levou a idéia de tsun tzu a nível de filosofia profunda, até conseguir a união com o zen-budismo, condicionado pelos preceitos sócio-filosófico de Confúcio, baseados na lealdade e respeito ao rei.
O HWARANGDO
Como dissemos, a participação no grupo do Hwarangdo só era permitida a jovens de berço nobre e de esmerada educação familiar. Seus códigos eram assombrosamente parecidos com os dos cavaleiros da Távola Redonda do rei Artur.
O valor dos guerreiros do Hwarangodo chegou a ser lendário, e suas façanhas bélicas ajudaram muito a unificação do país, servindo de inspiração a poetas de épocas posteriores.
Em fins do século VIII, infelizmente, as forças armadas de Silla entraram em decadência. Os chefes de guerra do Hwarangdo foram perdendo sua integridade e converteram-se numa pervertida e ociosa elite de aburguesados.
O assassinato do rei de Silla Wongtao, no ano de 780, trouxe consigo uma série de intrigas palacianas e de movimentos de alta política para conquista do poder. Em 892, Kio Wung, um nobre rebelde, formou o reino independente de Paekje. No ano 901, Kun Gye, filho bastardo do rei assassinado, fundou o reino livre de novo kogurio.
Wang Kong, um dos brilhantes oficiais de Kun Gye, sucedeu-o em 918, transferindo a capital para Kaesong e trocando o seu nome de Kogurio para Koryo. Fortaleceu-se belicamente e, em 935, derrotou por completo os restos pervertidos da outrora magnífica Silla, obrigando seu rei abdicar o trono. Fundou então a dinastia Koryo, que governou a península até 1392, quando os Yi tomaram o poder.
Já no século XII e sob a dinastia Yi, o monge Mioch Ong, líder militar cuja filosofia religiosa era uma mescla de confucionismo e budismo, favoreceu efetivamente o desenvolvimento das artes marciais. Especializou-se nos métodos chineses de combate com mãos limpas, tornando-os parte integrante da instrução militar dos coreanos. Sua estratégia baseava-se na proteção, com salvas de flechas dos guerreiros de infantaria que lutavam com mãos vazias. Sua tática preferida era debilitar o centro da frente de combate a fim de permitir a penetração inimiga e contra-atacar com as salvas cruzadas dos arqueiros.
Além disso, Mioch Ong foi o líder militar que compreendeu o potencial ofensivo da espada em combate, e tomou consciência do escasso desenvolvimento da esgrima em seu país, obrigando de imediato a um intenso treinamento nesta arte. As invasões mongóis, entre 1200 e 1250, introduziram muitas estratégias bélicas na Coréia, especialmente as técnicas de cavalaria e do arco e flecha.
Mas, sob o domínio da dinastia Yi, os intelectuais governantes passaram a menosprezar os guerreiros. Os lideres militares foram gradualmente substituídos por civis influentes, que trouxeram a decadência das artes marciais.
Hoje o taekwondo é esporte nacional coreano, obrigatório nas escolas e exercícios militares, e sendo também a arte marcial com o maior número de adeptos do mundo.
TAEKWONDO CONTEMPORÂNEO
Hoje o Taekwondo é uma modalidade esportiva muito difundida mundialmente, sendo consagrado esporte olímpico oficialmente no ano de 2000, nas Olimpíadas de Sidney.